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quarta-feira, 16 de julho de 2014

Indiscrição (1945)


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Barbara Stanwyck: a mulher que podia fazer tudo. Uma lenda das telas.

Uma das maiores atrizes da era clássica do cinema estaria completando 107 anos hoje. Com mais de 80 filmes no currículo, Stanwyck sofreu da mesma síndrome que atormenta Leonardo di Caprio: a Academia simplesmente não reconheceu seu talento. Foi indicada ao Oscar quatro vezes, todas por filmes lacradores, e não ganhou nenhum. Mais para o final de sua vida ganhou o prêmio Cecil B. De Mille, o Oscar honorário pelo conjunto da obra. A programação do canal americano, TCM , homenageia a diva exibindo filmes para todos os gostos. É aí que quero chegar.

Não é a toa que coloquei no começo deste post o banner que o TCM está utilizando para anunciar a maratona Barbara Stanwyck. Nas palavras de uma amiga minha: “ela canta, dança, sapateia, samba na cara”. E é verdade. Poucas atrizes conseguiam ser tão versáteis quanto ela. Fez drama (Stella Dallas – um filme para ver e rever), filme noir (lacradora como Phyllis, a vilã de Pacto de Sangue), suspense (Sorry wrong number, QUE FILME!) e muito mais. Nesta pequena homenagem a ela, falaremos sobre uma de suas facetas menos conhecidas, acredito: a comédia. Indiscrição (Christmas in Connecticut) é uma deliciosa surpresa tanto no quesito roteiro quanto atuações.

Christmas in Connecticut foi lançado em 1945,último ano da Segunda Guerra Mundial. Um de seus maiores acertos, na minha opinião, é a viagem ao estilo de vida e valores durante a guerra que o filme nos proporciona. Quase uma experiência sociológica que inclui muitas risadas por satirizar o american way of life.

A abertura de Indiscrição é bastante parecida com a de A felicidade não se compra de Frank Capra. Nela, temos cartões de natal intercalados com a música Jingle Bells. Barbara Stanwyck, Dennis Morgan e Sydney Greenstreet desejam-lhe um feliz natal em Connecticut – é o que o primeiro cartão diz. E então começa o Jingle Bells, deixando a gente com vontade de antecipar o natal. Acho que os espectadores da época tambem sentiram isso, já que o filme foi lançado em julho de 1945, em pleno verão americano.


O filme conta a história de Jefferson Jones (Dennis Morgan), que fica à deriva no mar depois que um submarino alemão atinge o contratorpedeiro americano. Ele é resgatado meses depois e vai para um hospital. Jeff acha que agora terá toda a comida que quiser, depois de meses passando fome, afinal ele é um heroi de guerra e tudo mais. Porém toda essa comida se resume a leite com ovo. É engraçado notar como esse pequeno detalhe já é uma desconstrução do sonho americano. Vale lembrar que o esforço de guerra em Hollywood tentara embelezar a guerra, vide o filme Hollywood Canteen. Trata-se das formas de mostrar o que realmente acontecia nos bastidores de uma guerra. Lá pelas tantas, Jeff recebe um conselho de seu companheiro de hospital: ele tem de conquistar a enfermeira se quiser receber uma refeição melhor. E é o que ele faz. E se eu quebrar o coração dela? Antes quebrar o coração dela do que o seu estômago. Esse pequeno fragmento de dialogo entre os personagens estabelece a triste realidade da guerra: vale tudo. Vale tudo pela sobrevivência. Jeff seduz a enfermeira, que o mima e gosta de ler para ele a coluna de Elizabeth Lane (Barbara Stanwyck), uma cozinheira renomada americana.

Jeff sonha com a fazenda em Connecticut, casa de Elizabeth, e as típicas refeições americanas preparadas por ela. Compadecendo-se do fato da personagem não ter casa (e de olho em um futuro casamento), a enfermeira escreve ao editor da revista, Alexander Yardley (Sydney Greenstreet), pedindo que Elizabeth hospede Jeff durante o natal. Como um bom americano, Yardley se compadece da situação desse heroi de guerra e manda chamar Lane para avisar que Jeff está indo passar o natal em sua fazenda em Connecticut.



Só havia um detalhe: Elizabeth era uma cozinheira de mentira. A maneira como Peter Godfrey, o diretor do filme,  nos mostra isso é sensacional: enquanto ela está descrevendo as lindas paisagens da Nova Inglaterra, a câmera vai mostrando o ambiente simplório que a personagem vive, com direito a estufa estragada e roupas do vizinho voando no varal. Sendo uma cozinheira de mentirinha a confusão está formada. Para não perder o emprego e o posto de grande cozinheira americana, Lane aceita fazer um teatrinho para Jeff e Yardley. E claro: o dever de uma americana. Uma americana que apóia a guerra DEVE hospedar um homem do calibre de Jeff em sua casa. Além disso, Elizabeth descreve um mundo onde todos queriam viver, com vacas, fazendas e refeições grandiosas. Sua escrita era uma forma de escapismo à dura realidade de guerra.
Será que ela irá conseguir se sair bem dessa?

A dinâmica do filme é nos deixar ansiosos e com medo o tempo inteiro de Elizabeth ser descoberta. Um juiz tenta casar Elizabeth e seu amigo, John Sloan (Reginald Gardiner), durante toda a história. Ele tem de sair pela janela para que Yardley não desconfie de nada. Felix, o cozinheiro que está por trás de Elizabeth, tem de acompanhá-la até a suposta fazenda para que ela não seja descoberta. A sacada do filme é brincar com aquilo que parece ser e não é. Tal como o sonho americano e esse esforço de embelezamento durante uma guerra. 

Barbara Stanwyck está maravilhosa nessa comédia. Uma vez assisti a um vídeo sobre ela que dizia: “cada personagem dela tem uma nuance completamente diferente da outra”. E é verdade! Como ela consegue sair bem da pele de cada personagem. Indiscrição foi rodado um ano depois de Pacto de Sangue, e é incrível o abismo que separa as duas personagens. Aqui temos uma Barbara cheia de malemolência, tentando mostrar que sabe cozinhar (a cena em que ela joga uma panqueca no ar e ela gruda no teto é algo), diferentemente de Phyllis de Pacto de Sangue e toda aquela atmosfera de morte no ar.

Te convido a terminar a noite assistindo a esse filme maravilhoso. Vem!

Curiosidades:
  • Barbara Stanwyck e Peter Godfrey se tornariam bons amigos depois desse filme. Trabalhariam juntos novamente em 1947 nos filmes Inspiração Trágica e Mansão da Loucura.
  • O cenário de Levada da breca foi reaproveitado para criar a fazenda de Elizabeth Lane. Mais informações aqui: http://hookedonhouses.net/2008/12/25/the-stone-farmhouse-in-christmas-in-connecticut/
  • A personagem Elizabeth Lane foi supostamente inspirada em Gladys Taber, colunista que escreveu mais de 50 livros sobre culinária.
  • É possível neste vídeo ter acesso a duas falhas nossa de Indiscrição
Jesus, por que você não coloca essas pernas no lugar onde elas deveriam estar

Feliz aniversário, Missy!

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