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sábado, 31 de agosto de 2013

Os sabores do palácio (2012)



Minha relação com a França beira o amor e o ódio. Quando entrei na Letras, eu achava que conhecia muito da França. É, croissant, Torre Eiffel, Piaf, essas coisas que fazem a gente achar que conhecemos o hexágono. Mas não. Eu não conhecia a França e talvez não chegue a conhecer 1% do necessário. É como se cada pedacinho desse país fosse uma gavetinha, você abre e, voilà, um milhão de coisas inesperadas. Hoje eu quero abrir a gavetinha chamada “gastronomia francesa”. 



 Os sabores do palácio, para começar, era um filme que eu não esperava o lançamento no Brasil. Sou bem pessimista em relação à isso, acho que só um tipo de filme francês é lançado aqui: aqueles ditos “cults”, que colocam alguns para dormir. Mas graças a Deus existe um negócio chamado Festival Varilux de cinema francês. É a chance para assistir vários filmes franceses e comprovar que eles fazem cinema para todos os gostos. Qual não foi a minha surpresa ao saber que Os sabores estava no programa do festival? Como assim?


Antes de ir ao cinema assistir ao filme, presenciei uma discussão mais velha que minha vó na caixa de comentários do trailer do You Tube: americanos X franceses? Vi americanos xingando franceses, usando o argumento de “fala sério, um filme sobre comida, que porcaria é essa?” Os franceses mais exaltados respondiam que um cara que só comia batatinha chips e hamburguer não tinha sensibilidade para apreciar um filme sobre cozinha. Assim a discussão seguia eternamente. Fui para o cinema ainda mais curiosa.

Os sabores do palácio conta a história de Hortense Laboirie (Catherine Frot), uma chef de cozinha do Périgord, situada no departamento da Dordogne, que é contratada para preparar as refeições pessoais do presidente da república. Uma das coisas que mais amo no cinema é essa capacidade de contar uma história grandiosa com elementos simples. É o caso de Os sabores. Sua história não tem nada de genial, no entanto, o filme consegue ser mágico. Consegue dar uma aula de cultura francesa de uma maneira muito própria. Afinal, não somos o que comemos? Quer dizer, no filme, a lógica seria “somos o que preparamos”.

Quando Hortense chega ao Palácio do Elysée para cozinhar para o presidente, ela não é lá muito bem recebida pela cozinha central, chefiada pelo Monsieur Lepic. Aqui é engraçado, pois cozinha está quase sempre associada às mulheres; não homens. No entanto, aqui acontece o contrário: Hortense é hostilizada pela cozinha central, composta só de homens. Para começar, ela é uma afronta por estar ali querendo mandar quando já existe alguém que manda ali, no caso, Lepic. Segundo, Hortense é do interior da França. As receitas que ela prepara, algo como as receitas de vó, são motivo de rechaço por seus colegas de cozinha. Talvez isso não fique claro, pois quando vemos os pratos que ela prepara tudo que não é pensamos é na falta de refinamento deles. Contudo, para os padrões da alta cozinha francesa, o que Hortense prepara não é tão “refinado” assim. Por isso, a personagem ganha a alcunha de Du Barry, um apelido nada jocoso dado pela cozinha central. Madame DuBarry era a preferida de Luis XIV e sua amante também. Ou seja: aquela louca está se deitando com presidente e virando os conceitos de cozinha de cabeça para baixo.



A relação de Hortense com a comida é algo interessante. Ela me parece ser uma metáfora da relação da França com sua gastronomia. A personagem começa a criar problemas com o palácio ao decidir ter seus próprios fornecedores, política teoricamente não permitida, pois tudo deveria passar pelo controle de um funcionário. Hortense faz isso para proporcionar ao presidente os melhores produtos, que vêm do interior da França, já que Paris não é muito variada nesse quesito. Assim como Hortense, a França quer dar seu melhor em relação à gastronomia. Não é à toa; eles são pioneiros nesse negócio. Tão pioneiros e orgulhosos que hoje a gastronomia é patromônio da UNESCO. Quer algo mais francês que isso?  


O único problema do filme é que você não vai conseguir copiar as receitas em casa. Os sabores funciona como uma grande propaganda da França, nos incitando a ir para lá e provar todas essas maravilhas gastronômicas. Também nos faz refletir sobre o papel da comida em nossas vidas. Em um dos melhores momentos do filme, Hortense recria lembranças da infância através do cardápio de um almoço que é oferecido ao presidente e seus parentes. Quantos de nós não se pegaram dizendo que tal comida tem “sabor de infância”? Mais ou menos por aí. Aquilo que colocamos na boca vai muito além de saciar uma fome. Por que nos reunimos com amigos para comer? Simples: comer é um prazer. A cada garfada, uma sensação diferente. No caso de Os sabores do palácio: a cada cena salivamos mais e mais.

Publicado por Jessica Bandeira 

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